terça-feira, 2 de dezembro de 2014

Questão de Direito Penal: teorias fundamentadoras da punição da tentativa (Cespe 2014)

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Magistratura Estadual
Concurso: TJDFT 
Ano: 2014
Banca: CESPE 
Disciplina: Direito Penal
Assunto:  teorias fundamentadoras da punição da tentativa


"No delito doloso não se pune apenas a conduta que chega a realizar-se totalmente ou que produz o resultado típico, pois a lei prevê a punição da conduta que não chega a preencher todos os elementos típicos, por permanecer numa etapa anterior de realização" (Eugenio Raúl Zaffaroni e José Henrique Pierangeli in Manual de Direito Penal Brasileiro, volume 1: parte geral. 7a ed. rev. e atual. tiragem — São Paulo: RT, 2008, p. 598). 

Discorra de forma sucinta sobre as teorias fundamentadoras da punição da tentativa, indicando, pelo menos, quatro correntes doutrinárias e as principais críticas que recaem sobre cada uma delas. 


Resposta:



As Teorias Fundamentadoras da punição da tentativa são, basicamente, quatro: Teoria Objetiva (ou realística ou dualista), Teoria Subjetiva (ou voluntarística ou monista), Teoria Subjetivo-Objetiva (ou Teoria da Impressão) e  Teoria Sintomática (ou a "preconizada pela Escola Positiva").

O nosso Código Penal (CP) adotou a doutrina objetiva. É o que se contém no art. 14, parágrafo único. Por esta que se inicia a análise.


Para Nucci 1, o objetivo da punição da tentativa volta-se ao perigo efetivo que o bem jurídico corre, o que somente se configura quando os atos executórios, de caráter unívoco, têm início, com idoneidade, para atingi-lo. Leva-se em consideração tanto o desvalor da ação quanto o desvalor do resultado. A redução da pena torna-se, então, obrigatória, uma vez que somente se poderia aplicar a pena igual à que seria cabível ao delito consumado se o bem jurídico se perdesse por completo — o que não ocorre na figura da tentativa


Para Bitencourt 2, a punibilidade da tentativa fundamenta-se no perigo a que é exposto o bem jurídico, e a repressão se justifica uma vez iniciada a execução do crime. Não se equipara o dano ou perigo ocorrido na tentativa com o que resultaria do crime consumado. 


Damásio 3 esclarece que para seus partidários, o fundamento da punibilidade da tentativa reside no perigo a que é exposto o bem jurídico. Não se tendo realizado o dano almejado pelo agente, o fato por ele cometido deve ser apenado menos severamente.  


Entretanto, Zaffaroni e Pierangeli 4 afirmam que para uns, a tentativa é punida atendendo a critérios objetivos, porque coloca em perigo um bem jurídico. Se assim fosse, o problema levaria a uma duplicidade de perigos nos crimes de perigo. 


Já Rogério Greco 5, inicialmente, assevera que a teoria objetiva, adotada como regra pelo nosso Código, entende que deve existir uma redução na pena quando o agente não consiga, efetivamente, consumar a infração penal, quer dizer, a pena para a tentativa deve ser menor do que aquela aplicada ao agente que consegue preencher todos os elementos da figura típica. Na sequência, aduz que referida regra sofre exceções, como no caso em que o legislador pune a tentativa com as mesmas penas do crime consumado, prevendo-a expressamente no tipo, a exemplo do art. 352 do Código Penal. Por essa razão, ou seja, por causa da ressalva contida no parágrafo único do art. 14, é que podemos concluir ter o Código Penal adotado a teoria objetiva temperada, moderada ou matizada, isto é, a regra é que a pena correspondente ao crime tentado sofra uma redução. Contudo, tal regra sofre exceções, conforme previsto pelo próprio artigo. Assim, embora adotando-se uma teoria objetiva, ela não é pura, mas sim, temperada, moderada ou matizada. 


Sobre a Teoria Subjetiva, Nucci, ensina que a referida teoria leva em consideração, para justificar a punição da tentativa, fundamentalmente, a vontade criminosa, desde que nítida, podendo ela estar presente e identificada tanto na preparação quanto na execução. Leva-se em conta apenas o desvalor da ação, não importando, para a punição, o desvalor do resultado. Nesse caso, inicia-se a possibilidade de punir a partir do momento em que o agente ingressa na fase da preparação. Como o objetivo é punir aquele que manifesta vontade contrária ao Direito, nem sempre deve o juiz atenuar a pena.


Conforme Bitencourt, a Teoria Subjetiva fundamenta a punibilidade da tentativa na vontade do autor contrária ao Direito. Para essa teoria o elemento moral, a vontade do agente é decisiva, porque esta é completa, perfeita. Imperfeito é o delito sob o aspecto objetivo, que não chega a consumar-se. Por isso, segundo esta teoria, a pena da tentativa deve ser a mesma do crime consumado. Desde que a vontade criminosa se manifeste nos atos de execução do fato punível, a punibilidade estará justificada.


Damásio leciona que a teoria subjetiva vê na manifestação da vontade do agente, que é perfeita, a razão da punibilidade da tentativa. Imperfeito é o crime sob seu aspecto objetivo, pois não chega a consumar-se. Em face disso, a pena do conatus deve ser a mesma do delito consumado. Assim, aquele que pratica uma tentativa branca de homicídio (que não produz ferimento) deve ter a mesma sanção do homicídio consumado. 


Rogério Greco esclarece que, segundo a teoria subjetiva, o agente que deu início aos atos de execução de determinada infração penal, embora, por circunstâncias alheias à sua vontade,não tenha alcançado o resultado inicialmente pretendido, responde como se a tivesse consumado. Basta, como se vê, que a sua vontade seja dirigida à produção de um resultado criminoso qualquer, não importando se efetivamente ele venha ou não a ocorrer. Aqui será aplicada ao agente a pena cominado ao crime consumado, não incidindo, outrossim, redução alguma pelo fato de ter permanecido a infração penal na fase do conatus. 


Por outro lado, Zaffaroni e Pierangeli afirmam que para outros, a teoria subjetiva é a que predomina, isto é, a tentativa é punida porque revela uma vontade contrária ao direito. Conforme este critério, como a vontade contrária ao direito existente na tentativa é igual à do delito consumado, não se deve distinguir entre a pena da tentativa e a do delito consumado. Isto também é inadmissível frente a nossa lei positiva que estabelece uma pena reduzida para a tentativa. 


Sobre a Teoria Subjetivo-Objetiva, Nucci leciona que o fundamento da punição é representado pela junção da avaliação da vontade criminosa com um princípio de risco ao bem jurídico protegido. A tentativa é punível, quando e na medida em que é apropriada para produzir na generalidade das pessoas uma impressão juridicamente abaladora; ela põe, então, em perigo a paz jurídica e necessita, por isso, de uma sanção correspondente a esta medida. Como se leva em consideração a vontade criminosa e o abalo que a sua manifestação podecausar à sociedade, é faculdade do juiz reduzir a pena. 


Já Zaffaroni e Pierangeli críticam a Teoria Subjetivo-Objetiva. Esclarecem que a partir da teoria da prevenção geral, afirmou-se que a tentativa é punida por ser perigosa qualquer conduta que produz, no seio da comunidade, a impressão de uma agressão ao direito, e mediante a qual fica prejudicada a sua firme validade na consciência da comunidade. Segundo esta teoria, se sustentaria que o único fundamento da punição da tentativa seria o alarme social, o que por si mesmo não tem sentido, posto que o alarme social sempre obedece à afetação de um bem jurídico. A teoria da impressão resultaria, frente à nosso direito positivo, francamente violatória do princípio republicano, na medida em que puniria condutas que não afetam bens jurídicos.


Finalmente, Nucci assevera que a Teoria Sintomática preconizada pela Escola Positiva, entende que o fundamento de punição da tentativa concentra-se na análise da periculosidade do agente.Poder-se-ia punir os atos preparatórios, não se necessitando reduzir a pena, de caráter eminentemente preventivo.


Sobre esta teoria, Zaffaroni e Pierangeli pontificam que outros, limitam-se a fixar-se no autor e a fundamentar a punição da tentativa na periculosidade do autor. Este critério — eminentemente positivista — tampouco funciona dentro de nosso sistema penal, porque levaria à punição a tentativa inidônea, não punível no Código (art. 17).




Bibliografia

1) Guilherme de Souza Nucci in Manual de Direito Penal: parte geral: parte especial. 52 ed. rev., atual. e ampl. — São Paulo: RT, 2009;

2) Cezar Roberto Bitencourt in Código Penal Comentado. 72 ed. São Paulo: Saraiva, 2012;


3) Damásio Evangelista de Jesus in Direito Penal, volume 1: parte geral. 332 ed. São Paulo: Saraiva, 2012;


4) Eugenio Raúl Zaffaroni e José Henrique Pierangeli in Manual de Direito Penal Brasileiro, volume 1: parte geral. 72 ed. rev. e atual. 22 tiragem — São Paulo: RT, 2008;


5) Rogério Greco in Código Penal: comentado. 42 ed. Niterói, RJ: Ímpetus, 2010, pp. 43/44);



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